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O 8 de Março visto por uma trabalhadora sexual

Por Iaglasnost, publicado em 4 de março por Abbatto i Muri.

Camilla. Separada. Mãe de dois filhos. Minha nacionalidade não é importante. Sou uma mulher adulta, ainda bonita e, depois de ter tentado em vão outro emprego, porque eu tinha contas para pagar, decidi colocar um anúncio em um site e comecei a receber telefonemas de clientes potenciais. Eu não tinha ideia de qual seria meu trabalho, mas eu sabia de qual realidade eu vinha.

Casada muito jovem, não completei os estudos. Na Itália, o diploma que eu tinha não foi reconhecido. Tudo o que eu podia ser era camareira, diarista ou ter outros pequenos empregos, só atividades pouco ou mal remuneradas.

Meu ex-marido me fez passar pelo inferno. Agressivo, violento. Mesmo querendo manter a família unida, eu não conseguia mais suportar os maus tratos a que ele me submetia. Pedi para ele ir embora e ele não pensou duas vezes, foi. Ele não conseguia assumir responsabilidades, não suportava o estresse e era sempre eu que fazia tudo. Então, tive que arregaçar as mangas e começar a trabalhar.

A primeira coisa que os clientes me perguntavam é se eu estava legalmente no país. Eu dizia que não precisava. Sou italiana e, portanto, eu não deveria ser passível de chantagem. Quem mais me fazia essa pergunta eram clientes vestindo uniforme, ou seja, aqueles que, supunha-se, deveriam ser os mais corretos.

Com o tempo, passei a não os considerar mais como clientes. Escolhi outros, porque, na minha profissão, pode-se escolher. Passei a me sentir mais bonita, sensual, carnal, inteligente do que tinha me sentido até aquele momento. Havia homens que faziam de tudo, desesperadamente, para conseguir um encontro comigo, e muitos só queriam carinho e conversar.

Alguns sofriam de solidão, outros queriam apenas um corpo para reclinar seus sonhos, para relaxar, parar por um momento e depois ir embora. Alguns eram realizados, bem de vida, e me preferiam a outras, porque eu trabalhava com um grande senso de ironia. Havia homens casados, noivos, jovens, velhos; eram muitos, mas cada um diferente do outro. O que eu descobri é que muitas das coisas que se dizem dos clientes são falsas, os estereótipos, clichês sem fundamento.

Conheci muitos e os mais simpáticos eram os que tinham tido experiências nada boas com mulheres no mínimo sexofóbicas. Mulheres que tinham recebido uma educação muito religiosa ou que tinham outras preferências sexuais. O sexo, como eu sempre dizia, é bonito quando é feito consensualmente e para dar prazer às pessoas que tocam, lambem, gozam, que se desejam. Não sei por que, mas às vezes eu tinha a sensação de que algumas mulheres não queriam corresponder ao desejo de seu parceiro de fazê-las ter orgasmos. Os clientes me pediam, frequentemente, para repetir o que eu sentia. Eles queriam saber o que me dava prazer, porque seu prazer era me fazer gozar. E quem era eu para recusar um orgasmo dado por quem, além de tudo, me pagava? Quando tentei contar isso para as pessoas que eu conhecia, por pouco não me consideravam ninfomaníaca. Eles queriam saber detalhes mórbidos e truculentos, mas eu não tinha tido nenhum trauma, a menos que se considere um trauma a vez em que um cliente veio até mim e começou a chorar.

Eu tinha sobrevivido a um marido violento. Esse era o meu único trauma. Este trabalho, no entanto, que eu ainda continuo a fazer, deu-me condições para criar meus filhos, pagar as contas e viver decentemente. E eu gostei. Por que eu deveria dizer que não, se para mim essa profissão foi e ainda é prazerosa? Alguém me disse uma vez que o fato de eu gostar não significa que seja bom para todas. Mas eu não acho que as mulheres sejam forçadas com uma arma apontada para sua cabeça a fazer o que eu faço. Algumas são forçadas, é verdade, pela necessidade de dinheiro, como fariam os trabalhadores, empregadas domésticas, os cuidadores, mas com a prostituição ganha-se mais e se você não têm problemas morais e é dotada de ironia o suficiente, é um trabalho que, no que me diz respeito, emancipou-me financeiramente.

Aquelas que são forçadas e exploradas são outra coisa. Devem ser defendidas, ajudadas e eu sou a primeira a dizer isso, mas também há pessoas como eu, como outras colegas de trabalho, colegas homens e irmãs trans, que não são explorados. Eu não sou. Eu me prostituo, ganho dinheiro, eu gostaria de recolher e pagar impostos, de ter direito a uma assistência médica adequada, poder fazer tudo à luz do Sol.

Eu também gostaria de poder dizer a meus filhos sem me envergonhar e, acima de tudo, eu gostaria que o mundo ao seu redor não tornasse a vida deles difícil, caso soubessem o que eu faço. Não sou eu o problema. Nem os clientes. Então, do que estamos falando?

Em poucos dias, será 8 de março. Serão muitos a comemorar hipocritamente o dia que é dedicado principalmente às passarelas de politiqueiros e a mulheres que não precisam trabalhar ou que pensam que têm o direito de me dizer como devo viver.

Desejo que todas as mulheres possam, no entanto, fazer suas escolhas sem ter que suportar sermões de ninguém e espero que não sofram estigmas negativos, que não sejam julgadas por não se alinharem à moral comum. Que vocês encontrem lugares em que haja solidariedade, nos quais se fale de renda, casa e trabalho, em vez de quantos centímetros de pele você deve mostrar. Desejo a vocês o mundo todo. A vocês e um pouco para mim, também.

PS: Esta é uma história verdadeira. Obrigado a quem me contou. Qualquer referência a coisas, pessoas e eventos é mera coincidência.


Tradução de Lidia Barros.

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