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Maya Angelou, trabalhadora sexual e heroína

Texto original em Decriminalize Sex Work

Para muitas pessoas, Maya Angelou dispensa apresentações.

Maya Angelou em 1969

Nascida Marguerite Annie Johnson em St. Louis, MO em 1928, Angelou se tornou um nome conhecido nos anos 1970, depois de publicar I Know Why the Caged Bird Sings, a primeira de suas sete obras. Ela continua sendo reconhecida por sua escrita e sua contribuição ao movimento por direitos civis. Mas Angelou é também um ícone cultural que transcende sua obra escrita. Ela abriu espaço para a realidade crua e uma representação destemida da confusão e contradições do que significa ser humano.

Esse realismo descarado, tanto dentro quanto fora das páginas, foi revolucionário, dando vida ao trabalho que a tornou amada por tantas pessoas. Isso foi também o que levou I Know Why the Caged Bird Sings a ser banido de muitas escolas quando foi publicado pela primeira vez. O romance falava da experiência de Angelou com abuso sexual quando criança.

Subestimada, a segunda obra de Angelou, Gather Together in My Name, detalha sua experiência como trabalhadora sexual na juventude. A protagonista, Marguerite, é uma mãe solteira lidando com racismo, educação, pobreza, letração e estigma enquanto tenta encontrar seu lugar no mundo. “Eu escrevo sobre minhas experiências por que eu penso que muita gente diz aos jovens, ‘eu nunca fiz nada de errado. Quem, moi? – eu nunca. Eu não tenho esqueletos no meu closet. De fato, eu não tenho um closet’”, Angelou fala sobre o livro. “Eles mentem assim, e então os jovens se veem em determinadas situações e pensam, ‘que droga, eu devo ser uma péssima pessoa. Meus pais nunca fizeram nada de errado.’ Eles não conseguem se perdoar e seguir com suas vidas.”

Quando Maya Angelou faleceu, em 28 de maio de 2014, o mundo elogiou seu caráter, uma inspiração para mulheres de todos os lugares, particularmente mulheres negras.  Mas o debate sobre sua vida laboral em grande parte silenciou sobre sua atuação como trabalhadora sexual. Em uma olhada nos obituários ou tributos divulgados após sua morte, isso é mencionado superficialmente, quando mencionado, como uma “breve passagem” no sexo comercial, tratado como um fato desimportante ou desagradável – uma afronta à política de respeitabilidade ou a seu legado. Isso é particularmente preocupando quando consideramos o quão aberta a própria Angelou sempre foi a este respeito.

O trabalho sexual foi apenas uma das muitas profissões de Angelou. Foi apenas no final dos anos (19)50 e início dos (19)60 que ela se mudou para Nova Iorque e passou a se dedicar à sua carreira de escritora. Antes disso, ela foi dançarina de boate, chapista e a primeira mulher negra a dirigir um bonde em São Francisco. Mais tarde, ela trabalhou como coordenadora e correspondente da Southern Christian Leadership Conference no Egito e Gana durante a descolonização da África.

Mas o trabalho sexual foi importante o suficiente para Angelou, a ponto de ela dedicar espaço a ele em sua escrita. Ela o fez propositalmente, para mostrar que os humanos são confusos, imperfeitos e multifacetados. “Nós fazemos escolhas pessoais todos os dias para sobreviver, para seguir em frente, fazer a ‘coisa certa’, e essas escolhas, particularmente aquelas que temos que fazer com nossos próprios corpos, são nossas.” Como Dr. Angelou disse, “Há muitas maneiras de se prostituir”.

A despeito de suas muitas mudanças de carreira, Angelou nunca se envergonhou de seu passado. Como escreveu Peechington Marie em seu artigo sobre o apagamento da história de Angelou como trabalhadora sexual:

A questão é: não há como, na cabeça da maioria das pessoas, ter trabalhado como prostituta e não se envergonhar disso… Para a maioria das pessoas, não há como uma mulher do calibre de Maya Angelou ter atuado como profissional do sexo. A ideia simplesmente não vai funcionar para eles, mas isso não significa que não seja a verdade. Maya Angelou: Poetisa Laureada, prêmio Pulitzer, vencedora do Tony Award, a autora mais vendida, poetisa condecorada com mais de 50 diplomas honorários, mãe, irmã, filha, esposa, vencedora do National Medal of Arts, vencedora do Presidential Medal of Freedom, mulher formada e poderosa, artista, e trabalhadora sexual. Sim, a mulher que você ama, a mulher que todas nós amamos, a incomparável Dra. Maya Angelou foi uma trabalhadora sexual, e provou em sua vida e em suas histórias que não há nada de errado nisso.

Em um mundo onde trabalhadoras sexuais são frequentemente reduzidas a criminosas viciadas ou vítimas sem voz e nome, Angelou fez o que ela faz de melhor: ela contou a verdade e criou espaço para o que é verdadeiro, mesmo quando essa verdade é complicada e faz com que as pessoas sintam emoções confusas e negativas sobre tudo aquilo que elas pensam saber.  Ela pressionou continuamente, para que mulheres, para que pessoas negras, para aquelas que se sentiam menos  do que eram levantassem suas vozes e tomassem posse de suas vidas preciosas e únicas.

Em suas próprias palavras:

Agora você entende

Apenas por que minha cabeça não está curvada.

Eu não grito ou pulo sobre

Ou tenho que falar realmente alto.

Quando você me vê passar,

Isso deveria te deixar orgulhoso.

Eu digo,

está no clique dos meus saltos,

A curva do meu cabelo,

a palma da minha mão,

the need for my care.

Porque eu sou uma mulher

Fenomenalmente.

Uma mulher fenomenal,

Essa sou eu.

(Phenomenal Woman)