17 de dezembro, Dia Internacional Pelo Fim da Violência Contra Trabalhadoras Sexuais: Um brinde a nós!
Nesse 17 de dezembro, Dia Internacional Pelo Fim da Violência Contra Trabalhadoras Sexuais, proponho um brinde especial às trabalhadoras sexuais!
Um brinde à sobrevivência das que fazem 20 programas por dia por 20 reais.
Um brinde à sobrevivência das que convivem com ISTs e continuam trabalhando.
Um brinde à sobrevivência das que trabalham sozinhas anunciando em sites e pelas foram rejeitadas pela família.
Um brinde à sobrevivência das que já foram discriminadas e humilhadas por conta do trabalho.
Um brinde à sobrevivência das travestis protegidas pela própria navalha.
Um brinde à sobrevivência das putas pretas e pobres que sofrem triplamente com a putafobia, o racismo e a aporafobia.
Um brinde à sobrevivência das putas deficientes que sofrem para além da putafobia com o capacitismo.
Um brinde à sobrevivência das que estão nos cabarés bebendo por comissão.
Um brinde à sobrevivência das que estão nas esquinas levando porradas da polícia.
Um brinde à sobrevivência das que estão no sistema prisional e não desistem de sair de lá.
Um brinde à sobrevivência das dependentes de drogas que trabalham mesmo sem receber um tratamento adequado para a adicção.
Um brinde à sobrevivência das que tiveram suas fotos e vídeos vazados na internet e foram expostas.
Um brinde à sobrevivência das que preferem esconder a profissão e das que não se reconhecem como profissionais, mesmo que sejam.
Um brinde à sobrevivência das que já foram agredidas por clientes.
Um brinde à sobrevivência das puta-mães que tiveram filhos de clientes que não os assumiram e de todas as puta-mães solo.
Um brinde à sobrevivência das que superam o próprio nojo e trabalham sem vomitar.
Um brinde à sobrevivência das que escolheram esse trabalho e das que enxergaram nele uma saída para continuar a existir.
Um brinde à sobrevivência das acompanhantes de luxo, que sabem que não há glamour nenhum em viver à sombra do estigma.
Um brinde à sobrevivência das que têm um puta orgulho do que fazem e das que também não sentem orgulho nenhum.
Um brinde à sobrevivência das que vieram de mim e continuam a lutar mesmo idosas ou em cadeiras de rodas. Um brinde à Vânia, à Lourdes, à Fátima, à Diana, à Carmem e a todo o Movimento de Prostitutas.
Um brinde à sobrevivência da nova geração de ativistas e escritoras, que tiveram o privilégio de estudar, aprender outras línguas e chegar até o mestrado ou doutorado. Um brinde a Monique, Amara e Frida e a todas que conseguiram ocupar esses espaços em que nossos corpos são indesejados.
Um brinde à sobrevivência da memória das que morreram na luta para combater a violência contra nós e pelos nossos direitos. Salve Gabriela Leite!
Um brinde à sobrevivência da lembrança das mulheres e prostitutas deixadas no green river mortas e mutiladas, que nos recorda todo dia 17 de dezembro que ainda pode haver justiça.
Um brinde à sobrevivência da esperança de que mulheres cis e trans parem de morrer por conta da putafobia e da transfobia.
Um brinde à sobrevivência das trabalhadoras que, diante dos trabalhos precários que nos são ofertados, exercem esse ofício sem ter aposentadoria ou direitos trabalhistas para nos proteger.
Um brinde à sobrevivência das que escolheram ou foram escolhidas por esse trabalho.
Um brinde à sobrevivência de todas nós que não entramos para as estatísticas de morte e temos a ousadia de viver ainda que tentem nos matar!
Desejo que um dia chegue ao fim a violência contra nós e que as descrições presentes nesse texto não reflitam mais a realidade de tantas mulheres. Até lá vamos continuar a denunciar o que apenas nós sabemos o que é sentir na pele.
Lady Brigitte
Lady Brigitte é dominatrix, ativista e putafeminista. É membra da ANPROSEX, pós-graduanda em Direitos Humanos, Responsabilidade Social e Cidadania Global pela PUC e adora escrever sobre trabalho sexual.